27 de fevereiro de 2015

Miguel

 

O caçula faz hoje anos. Onze. Mais de uma década! Parece mentira como o tempo passou a correr. Ainda ontem eras um bebé rechonchudo e chato como só tu. Nasceste com 4.750 Kg, e 54 cm, enorme, de olhos bem abertos e curiosos para o mundo. Não eras de todo o típico recém nascido quando nasceste, parecias maior, e mais consciente do mundo.

Acho que já antes referi que sou como as burras e faço gravidezes de 10 meses e por isso os piquenos têm de ser retirados, a bem ou a mal, quando se completam as 42 semanas e, mais uma vez, como aconteceu por altura dos outros partos, marcámos data.

No dia anterior, resolvi ir comprar uma roupa pequena, tamanho 0, para te vestir quando nascesses, para não ficares a boiar dentro do babygrow, como é costume. A previsão era que tivesses um peso médio, o que quer dizer mais ou menos 3,500 Kg e daí o tamanho 0. Fail! Eras enorme e quando chegou a hora de te vestir a tal primeira roupa não havia nada que te servisse. A enfermeira pedia uma roupa, experimentava e dizia "não dá, mãe". Outra tentativa e a mesma resposta" não dá, mãe" Terceira e quarta e nada. Conclusão, tiveste o privilégio de ter como primeira roupa uma linda bata do Hospital de Santa Maria, azul, com o logo do hospital impresso, a apertar atrás, que depois gamei para guardar como recordação.

A mala de roupa que levei para ti foi toda oferecida ao colega de quarto, o Rodrigo, que nasceu também nesse dia e que era um ratinho com menos de três quilos. Nova remessa de roupa foi pedida à avó que trouxe a que estava reservada para o mês seguinte. Havia romaria no hospital para ver o bebe grande. Era assim que eras carinhosamente tratado pelas enfermeiras e restante pessoal de serviço. Eras bonito, o mais bonito de todos!

Quando tivemos alta começou o tormento. Choravas, sem parar, durante 12-16 horas e nada te acalmava. Mamavas de duas em duas horas ou menos e esta rotina manteve-se por longos e penosos seis meses.
 Se tivesses sido o meu primeiro filho não teria tido coragem de ter mais nenhum. Foi uma verdadeira aventura, no mau sentido, claro. Sempre tinha olhado de lado aquelas mães que diziam que ter filhos era complicado, uma canseira e coiso e tal, que andavam de rastos e blá, blá ,blá. Pois, o karma é lixado. Tudo que duvidei que existisse de menos bom no nascimento de um filho aconteceu contigo.

Foste uma criança difícil desde sempre. Choravas que nem um desalmado, sem motivo nenhum. A empregada que tínhamos na altura, a Larissa, moldava, dizia "este menino tem um desconforto qualquer". Qual desconforto qual carapuça, o miúdo era chato mesmo. Se me contassem que havia crianças que choravam tanto e durante tantas horas seguidas eu não teria acreditado. Não gostavas de ninguém. Só eu ou o avô Rui te transmitiam alguma segurança. Se alguém olhava para ti na rua e te falava era um drama. Se eu tinha de te deixar por qualquer motivo, ficavas com febre até que eu aparecesse. Febres altas que não cediam nem com medicamentos nem com banhos nem com nada, apenas com a minha presença. Quando falei nisso ao pediatra ele disse que nunca tinha conhecido nenhuma criança tão pequena a fazer febres psicossomáticas, mas na verdade é que as fazias e não foi nem uma nem duas vezes, aconteciam sempre que te deixava. Não confiavas em ninguém a não ser mesmo na mãe e no avozinho querido.

As noites foram más até aos quatro ou cinco anos. Acordavas muitas vezes, choravas e chamavas acordando-me N vezes durante uma noite e não me deixando descansar convenientemente. Ainda hoje sonhas muito, falas e gritas e às vezes damos contigo levantado no meio do corredor. Rapidamente voltas para a cama quando mandamos e tenho a sensação que és até meio sonânbulo ou então ainda resquícios dos primeiros anos.

Foi contigo que percebi o que é o desespero de uma mãe. Tive de pedir ajuda muitas vezes. Pedir que te levassem para longe de mim porque eu não aguentava mais ouvir-te chorar e tinha medo de cometer uma loucura qualquer.
Foi uma primeira infância verdadeiramente de loucos. Já a gravidez tinha sido difícil. Cinco meses deitada com autorização para ir apenas à casa de banho e nada mais. O risco de aborto e parto foram constantes e as malditas contracções não nos largaram durante praticamente toda a gravidez.

O pediatra achava que esse inicio de vida complicado seria uma das causas para o teu desequilibro emocional nos primeiros tempos e eu acredito nisso, mas perceber o porquê é uma coisa e viver com a consequência outra totalmente diferente.

Continuas a ser o meu filho sensível, aquele que absorve as dores dos outros e do mundo e sofre com elas. Continuas a ser grande, comilão e atento ao mundo que te rodeia, mas hoje em dia és calmo e tranquilo e até nem és muito introvertido, gostas de ter amigos e não te importas de viver situações novas com desconhecidos. Gostas de brincar, como convém, mas não gostas lá muito de estudar o que é uma pena porque és esperto e podias ser melhor aluno se não fosses tão preguiçoso. Adoras jogar à bola e tens o sonho de ser futebolista mas não tens grande jeito para a coisa. O avô continua a ser uma pessoa importantíssima para ti mas, felizmente, conseguiste, entretanto, alargar o teu circulo intimo de confiança e és muito próximo dos manos. A Mónica é uma segunda mãe e o Bruno o herói e modelo que tentas imitar. Adoro vê-los  juntos porque têm uma cumplicidade muito vossa que me enche de orgulho. Também há discussões, amuos e guerras mas a relação é forte, de amor e protecção.
Tenho muito orgulho em ti e amo-te  de todo o coração. Sê feliz, meu filho!

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