10 de julho de 2014

Contratransferência e memórias



Ontem, em consulta, tive uma daquelas contratransferências. Para quem não sabe e tem curiosidade sobre estes temas, explico que a contratransferência é um conceito com origem na psicanálise e diz respeito aos sentimentos e emoções que o terapeuta experiencia em relação ao paciente, durante uma sessão de psicoterapia.

Como dizia, o relato do meu paciente fez-me reviver um dos momentos mais marcantes e sentir uma imensidão de coisas contraditórias que, como é óbvio, não vou expor aqui. Recordei tão intensamente a vinda para Portugal, retornada de Angola, com os meus 9 anos.

A última memória que tenho de Luanda é a de uma sessão fotográfica que a minha mãe fez questão de fazer para guardar. Era um tempo em que as fotos eram a preto e branco e o fotógrafo destacado para o serviço foi um tio, a quem sempre reconheceram jeito para a coisa. Eu e o meu irmão, vestidos a preceito, com uma mistura de riscas e quadrados que dá vontade de rir sempre que olhamos para as fotos, lá fomos para a ponta da ilha, empoleirados nas pedras, a contemplar o mar.

Se a memória não me atraiçoa gastámos um rolo inteiro entre os dois e devem ser as fotos mais bonitas que tenho desde sempre. Não me lembro se tive ou não consciência do que estava a fazer e do seu significado, sei apenas que quando olho para elas vejo mais do que as próprias imagens, vejo, sinto, cheiro, aquele mar e a saudade da terra é quase palpável. Sempre que olho para elas, agradeço à minha mãe essa ideia que, sendo tão simples, me permite ter sempre presente a minha terra e, hoje, agradeço também ao J. por me permitir reviver.

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