31 de julho de 2014

O saber não ocupa lugar

Estudos apresentados no encontro de anestesistas que se realizou em Dublin apontam para a existência de um possível terceiro estado de consciência. Todos sabem que existe e conhecem as diferenças básicas entre a consciência e a inconsciência. Aparece agora este terceiro estado, denominado dysanaesthesia, palavra inglesa para a qual não consegui tradução em português mas que na sua composição nos remete para uma disfunção relacionada com a anestesia.

Segundo o estudo publicado, neste terceiro estado de consciência o sujeito está anestesiado, inconsciente portanto, com o corpo paralisado, não sente dor ou qualquer incómodo durante a cirurgia, mas é capaz de ouvir, compreender e executar ordens simples como mexer um braço ou um dedo.

Não sei bem se fico feliz por esta descoberta ou assustada com a possibilidade de ser operada e estar neste estado, meio para cá meio para lá.




30 de julho de 2014

Quando devo procurar um psicoterapeuta?

dor de cabeca

Fazer psicoterapia não é apenas para pessoas doentes ou loucas, esse é o primeiro preconceito que temos de ultrapassar, é para todos, doentes ou não. A vergonha, o medo de não ser compreendido e aceite, de passar por juízos de valor e críticas e o preconceito social e familiar são os principais obstáculos que temos de combater quando equacionamos o desejo de procurar ajuda. É habitual ouvirmos dizer que a ajuda psicológica é para os fracos, para quem não consegue resolver os seus problemas sozinho e para quem não tem força de vontade.  Nada mais errado. A terapia é para qualquer pessoa e está indicada em duas situações, quando há um problema que não conseguimos gerir ou quando queremos conhecer-nos melhor e desenvolver as nossas capacidades, crescendo como seres humanos.

Se está a travessar alguma dificuldade porquê sofrer sem necessidade? Prolongar esse sofrimento e adiar a procura de ajuda profissional só irá agravar a situação e tornar mais difícil e prolongada a sua resolução. Falamos de dificuldades da vida normais e que podem ser ultrapassadas se a intervenção psicológica for adequada e no momento certo. Ao contrário o que diz o povo não nascemos para sofrer nascemos para ser felizes.

Outro mito comum e contra o qual  também temos de lutar é a ideia que a psicoterapia é cara e muito longa. É verdade que existem diversos tipos de terapia e algumas delas como a psicanálise, por exemplo, implicam um investimento alto e quase diário, mas muitas outras, como as psicoterapias breves e as comportamentais, como estão centradas no problema e na sua resolução e não nos traumas passados e histórias de infância, são relativamente curtas e bastante menos dispendiosas.
Outro medo expresso e que leva ao abandono precoce do processo psicoterapêutico  é o de ficar dependente do terapeuta. Falso. Uma terapia bem sucedida é a que fornece ferramentas e fomenta a independência e não o contrário.

Como saber, então, que está na hora de procurar um psicoterapeuta? Se está com alguma dificuldade pessoal, profissional ou relacional, se não consegue funcionar no dia a dia como funcionava antes, se se sente frustrado, oprimido ou afundado em pensamentos e/ou sentimentos e quer mudar esse estado de coisas, é o momento.

Assim, se sente
dificuldade em dormir, dorme pouco ou mal ou acorda cedo
dores sem explicação médica
alterações de peso
stress
dificuldade em gerir conflitos
solidão
ansiedade
problemas sexuais
medos inexplicáveis
raiva
dificuldade em tomar decisões
agressividade
tristeza
choro fácil
baixa auto estima
vontade de morrer
ataques de pânico
hiperactividade
dificuldades de concentração e/ou memória
apatia
desorganização de ideias
consumos exagerados de qualquer substância
viveu uma situação traumática

a procura de um terapeuta que o ajude a reflectir e a sair do sofrimento que estas situações acarretam pode ser a solução.

Lembre-se que em terapia o desafio não é pensar no que gostaria de mudar no passado, mas reflectir sobre o que pode mudar no presente.
              
  

29 de julho de 2014

É sempre bom saber

A Ordem dos Psicólogos Portugueses vai organizar o seu 2º congresso e o IX congresso Iberoamericano de Psicologia de 11 a 13 de Setembro deste ano, em Lisboa. Teremos como convidada Judy Kuriansky, terapeuta especialista em situações de crise que falará sobre a "Psicologia nas Nações Unidas: Importância e Impacto na participação dos psicólogos Iberoamericanos em questões internacionais e definição da agenda global".

Depois teremos o"Impacto da psicologia numa equipa de futebol", numa apresentação de Pedro Almeida, psicólogo do Benfica, e  ouviremos José Maria Buceta, antigo Director do gabinete de psicologia do Real Madrid e responsável da formação de psicologia dos treinadores de futebol, falar sobre a sua experiência e apresentar " Psicologia aplicada ao futebol". São duas comunicações que estou ansiosa para ouvir porque sempre me fascinou o mundo do futebol e o papel que os psicólogos podem desempenhar no desempenho das equipas e na motivação dos jogadores. Se pudesse, seria uma das minhas áreas de intervenção, no Sporting, claro.

28 de julho de 2014

Confiança como base da relação



Se perguntarem a um terapeuta de casal qual a pedra basilar de uma relação, provavelmente ele responderá que é a confiança. Mas o que é isso de confiar? Como é que um casal pode fortalecer a confiança um no outro e na relação? Em vez de cada um dos elementos se focar no que dá e recebe e fazer como que um extracto ou balanço com débitos e créditos, avaliando se a relação é equilibrada e/ou justa, se calhar, temos de ensinar a desviar o foco de atenção para uma terceira entidade que existe na relação - o "Nós". Dessa forma, evitamos as avaliações desajustadas de quem dá mais ou quem recebe mais, descentralizamos os sujeitos do seu próprio umbigo e focamos no que é essencial, a relação, a tal terceira entidade - o nós.

Para que esse nós fique mais forte, há determinadas aspectos que devem ser trabalhados e desenvolvidos.
segurança -  é importante saber que cada um dos elementos está a 100% na relação. Se houver uma percepção diferente por parte de algum dos membros do casal, essa pessoa tornar-se-á insegura e esse sentimento pode levar a comportamentos desajustados
empatia - necessidade de ir ao encontro do outro. É necessário deixar de lado egoísmos e teimosias e zelar pelo outro, pelos seus desejos, necessidades e felicidade.  Lá diz a música que "quem ama cuida".
aceitação - aceitar o outro no seu todo, com defeitos e deficiências. Ninguém é perfeito e exigir isso do parceiro é irrealista. Temos tendência para a idealização e depois zangamo-nos quando o outro não encaixa no ideal e isso não é justo.
prazer - realizarem tarefas a dois em que ambos retirem delas prazer, trabalharem a intimidade sexual é também fundamental
humor - um dos sinais mais fortes de uma terapia com sucesso é o conseguirem ainda rir um com o outro. Esforcem-se por não perderem a capacidade de rir um com o outro, um do outro e de vós e terão maior probabilidade de ser bem sucedidos.
partilha - a confiança constrói-se com objectivos comuns, quer sendo construir uma família, uma casa, trabalhar em conjunto, viajar. Esses objectivos e os esforços que fazem para os atingir, ajudam a cimentar a relação.

Por fim, não se esqueçam que  dois eus vivem no interior do nós e deve haver respeito de parte a parte e espaço na relação para ambos. A felicidade dá trabalho, não nasce por geração espontânea, tem e deve ser trabalhada continuamente.

26 de julho de 2014

Avó Minda

Hoje é dia dos avós e apesar de saber que os meus filhos têm os melhores avós que podiam ter, hoje tenho de falar  da minha avó Minda, que me criou e ensinou tanta coisa.
Foi a minha ama em Angola, durante o dia, todos os dias, enquanto a minha mãe trabalhava. Vivia na Vila Alice, numa casa de dois andares, com quintal, casa de amor, onde criou cinco dos dez netos. Já em Portugal, teve ainda paciência e amor para criar os restantes e alguns dos bisnetos, entretanto nascidos.
Ficou viúva com 47 anos, com quatro filhos menores e dois enteados a cargo e foi desde sempre uma lutadora. Verdadeira mãe coragem que tudo e todos enfrentou para poder sobreviver com um pouco de dignidade quando toda a dita alta sociedade lhe virou as costas.
Como avó foi tudo, foi mãe, amiga, professora, companheira de risos e passeios.
Ensinou-nos as regras bases de higiene e educação e, depois disso, tudo o resto.
Foi com ela que aprendi a cozinhar e a comer rancho e cozido pobre e tenho procurado aquela bôla que só ela sabia fazer e que apesar de ter tentado ensinar a tanta gente, ninguém consegue fazer igual. Não sabe ao mesmo, não é a mesma coisa.
Foi ela que me ensinou a tricotar, a bordar, a coser. Também pintava mas para isso eu não tinha mesmo jeitinho nenhum.
Dela herdei a forma e postura de corpo e com ela aprendi a gostar de medicina e armávamo-nos muitas vezes em especialistas quando nada sabíamos na verdade. Deu-me centenas de injecções e foi minha enfermeira em muitas ocasiões. Sempre que o tema era esse, ela recordava as vezes que me teve no colo em situações complicadas quando era bebé - "estiveste muitas vezes morta nos meus braços". Reza a história que de cada vez que me nascia um dente, tinha uma convulsão; de cada vez que tinha febre, passava os 40º e tinha uma convulsão. Parece que não fui fácil de aturar.
Foi com ela que aprendi a gostar de museus, que aprendi a gostar de livros e a viajar na leitura, foi com ela que aprendi a descobrir o mundo, as pessoas, a  politica e o futebol. Benfiquista ferrenha, discutíamos muitas vezes as nossas rivalidades clubistas, sem nunca discutirmos na verdade, mas em muitas outras coisas tínhamos formas semelhantes de pensar e sentir.
Dela herdei o ar zangado e altivo, a rudeza no trato e a aparente ausência de afectos.
Vanguardista, nunca achou escandaloso nada que acontecesse ao seu redor quer com filhos quer com netos. Divórcios, separações, mães solteiras, mães adolescentes, casamentos e recasamentos, filhos de pais diferentes, tudo ela aceitou, sem qualquer tipo de recriminação ou pudor.
Gostava de viajar, de falar com toda a gente de ouvir concertos e ver espectáculos de teatro, cinema e dança. Quis o destino que acabasse a vida quase cega e privada de todos esses prazeres mas nunca a vi sem aquela energia que a caracterizava e sem a vontade de tagarelar tão singular.
Fui a segunda neta e tive o privilégio de conviver com ela mais de quatro décadas e tenho saudades, muitas saudades de a ter por perto, de sentir aquele abraço que só ela sabia dar quando dele precisávamos. Não era de grandes manifestações de afecto, nunca foi aquela avó beijoqueira e melosa, mas nunca nos faltou quando dela precisávamos. Manteve-se firme, corajosa e lutadora sempre que a vida a traía e ensinou-me essa dureza e firmeza de sentimentos. Ás vezes, quando não consigo agir como era suposto, sinto que a estou a trair mas lá no fundo sei que fui boa aluna e que aprendi o básico que ela me quis transmitir.
Tinha histórias lindas para contar, da infância, única rapariga branca a viver no mato de Angola, mãe de uma irmã com meses, quando ficaram órfãs. Viveu uma vida cheia e intensa, dura, mas acredito que plena e feliz com a família que construiu.
Lembro-me dela em muitas coisas, em pequenas coisas, em muitos lugares.
Lembro-me das rosas em vasos pequeninos, da cama improvisada no sofá, nos passeios a pé, daquele anel, do xaile preto, do calor do seu olhar, do conforto das palavras, do toque da mão dela na minha, dos ensinamentos, das palavras quase sempre sábias, da ternura e amor, das pequeninas prendas que fez questão de me dar, da fragilidade final, mas daquilo que me lembro essencialmente é das nossas conversas intermináveis naquelas noites em que jantávamos as duas depois de mais uma aula de piano.
Por fim cuidei dela em duas ou três ocasiões, sempre por doença, numa troca mais que justa. Estive com ela quando partiu a perna, em massagens e banhos diários, depois quando partiu o pulso, fui com ela a algumas consultas e por último fui eu que a internei quando a pneumonia já não a deixava respirar.
Sinto a presença dela na minha vida muitas vezes  e sinto-a no meu coração sempre e só peço que se um dia  tiver netos possa ser para eles um pouco aquilo que a AVO MINDA foi para mim.

25 de julho de 2014

Luísa

Vi-te e gostei de te poder ver, beijar e abraçar, ainda que com imensa cautela para não te magoar.
Vi-te e não gostei de te ver frágil, magra, amarela, doente, mas reconheci no teu olhar a bondade imensa e a alma pura que sempre te reconheci.
Sempre foste linda, loira e de olhos azuis (não que isso tenha grande importância porque não tem mesmo nenhuma), mas eras linda, não há como nega-lo. Cara de boneca, elegante e distinta, postura de princesa e lindíssima, mas a tua verdadeira beleza não é essa, é a beleza interior. És a pessoa mais doce, ternurenta, compreensiva, tolerante e sem maldade ou inveja que conheço. Nunca te ouvi dizer mal de ninguém, nunca te ouvi zangada com a vida, nunca te vi expressar qualquer sentimento negativo. És um exemplo. Um exemplo de vida. Um bom exemplo! Se o mundo tivesse meia dúzia de Luísas seria, com toda a certeza, um pouco melhor.
És distraída, às vezes com algumas atitudes de criança despassarada, que sempre achei propositadas, e que só estão ao alcance das pessoas inteligentes, a quem dá jeito parecer que não o são. És cómica, com um estilo de humor muito peculiar e que não está ao alcance de qualquer um e muito disciplinada. Extremamente organizada, com as manias das limpezas e arrumações, boa mãe, irmã, mulher, nora, sogra, madrasta e AMIGA.
Foste para mim, numa altura complicada da vida, apoio, conforto e modelo a seguir - se tinhas conseguido seguir em frente e eras feliz eu também o poderia conseguir. Nunca me recusaste um café, uma conversa, uma oração, um conselho, um abraço. Estiveste sempre presente quando te pedi e, mesmo à distância, sempre senti o teu amor. Ser-te-ei eternamente grata por isso e pelo muito que contigo aprendi.. E não estou habituada a ver-te assim, frágil e doente. E dói. E massacra. E entristece-me sentir a impotência perante o teu sofrimento. A vida tem destas coisas, é muitas vezes injusta e dá tamanhas cruzes a quem não as merece de todo.
Vão dizer-te que tens de ser forte, que tens de ter coragem, que tens de fazer isto e deves pensar aquilo, que tens de agir assim e sentir assado mas sabes uma coisa, aqui que ninguém nos ouve, não tens nada nem deves nada nem precisas de fazer nada, Faz o que entenderes, sente o que precisares de sentir, age como te apetecer agir, grita, chora, ri, explode, insulta. Não há regras na doença nem manuais para seguir, por isso sê apenas tu própria e vive, vive cada dia como viveste todos os outros, com determinação e bondade, com fé e amor e acredita que tens à tua volta todo o amor que ao longo da vida semeaste, apenas porque mereces.

24 de julho de 2014

Report do salto de paraquedas da Mónica

Ontem levei um raspanete de um leitor deste blogue porque não tinha dado noticias sobre o salto de paraquedas da Mónica, o tal cujo anúncio me levou a ficar com os olhos esbugalhados de medo e os cabelos em pé. Pois, como o que é justo é justo e, reconhecendo que o leitor teve razão no comentário feito, aqui fica, com muiiiito atraso a devida actualização da situação.

Então, no dia aprazado, levantei-me à hora habitual e a menina já tinha saído para a sua aventura. Fiquei preocupada e peguei logo no telefone:
-  Foste embora e nem um beijo de despedida me deste... e se não te volto a ver?- disse em "pânico". Do outro lado, gargalhadas - estás louca de todo!.. não acontece nada e no final do dia já estou aí de novo para te azucrinar o juízo.
É claro que este diálogo só foi possível porque nos conhecemos bem e ambas sabíamos o que a outra estava a pensar e sentir e brincámos porque afinal a brincar se dizem as verdades e a brincar se afastam os medos. Acredito que tínhamos as duas um pequeno aperto no peito mas também sei que estávamos suficientemente serenas para este tipo de brincadeiras, mas confesso que à hora em que era previsível o salto, por volta das 12 horas, não me contive e a ansiedade aumentou mesmo e só normalizou quando ela telefonou, excitada e deslumbrada com a experiência :
- Foi brutal, mãe, para o ano tenho de repetir. Lindo! Espectacular! O máximo!
Face a todas estas declarações e às emoções pressentidas  só consegui dizer - para o ano também vou!
Não sei mesmo quem é que é mais louca, se a mãe se a filha, mas provavelmente sou mesmo eu que já tenho idade para ter juízo, não é? 

23 de julho de 2014

A viagem para Portugal

Há alguns dias falei aqui sobre as últimas fotografias que tirei quando os meus pais decidiram mandar-me para Portugal, depois da revolução de 1974. Recordei esses momentos e deixei aqui o testemunho dessas memórias. Hoje vou mais além e vou recordar a viagem de avião.
Vim apenas com o meu irmão, quatro anos mais velhos, entregue às hospedeiras (antigamente chamavam-se hospedeiras às actuais assistentes de bordo), que deveriam zelar pelo nosso bem estar durante a viagem e entregar-nos, qual mercadoria, aos nossos avós paternos que, esperávamos, estariam à nossa espera no aeroporto. Não tenho grandes memórias da despedida dos meus pais e restante família, mas recordo muito bem tudo o resto.
A viagem foi horrível, num avião cheio de mulheres, crianças e especialmente bebés, muitos bebés, deitados numas camas suspensas do tecto do aparelho. Se pensarem nas redes de descanso brasileiras que se colocam no jardim, presas entre duas árvores, ficam com uma ideia aproximada das camas de bebés de que vos falo. Os miúdos, insuportáveis, choraram a viagem toda. Acredito que não tenha sido bem assim e seja apenas a minha memória a exagerar, mas a verdade é que é disso que me lembro, do choro contínuo e da tristeza no rosto das mães. De alguma forma, sentia-se o peso da viagem e o seu significado: o sair de um país onde se nasceu e cresceu e que se tinha de abandonar à pressa e se intuía, lá no fundo do coração, que seria para muitos uma viagem sem regresso. Ouvia-se o choro dos bebés e crianças e viam-se lágrimas silenciosas nos rostos das mães e dos parentes em terra. As hospedeiras andavam numa roda viva, tentando atender todos os pedidos e de vez em quando uma vinha ver como estávamos. O meu irmão, como mais velho, assumiu o controlo e a responsabilidade pelo meu bem estar e segurança da viagem e tentava dar-me a mão, de vez em quando, e fazer-me uma festa que me confortasse mas, na realidade, o conforto era muito pouco. Tinha deixado os meus pais, pilares de vida, para trás, num país em guerra. Bem sei que me prometeram ir ter connosco assim que lhes fosse possível e que escreveriam todos os dias. Acreditei em ambas as promessas feitas mas o nó na garganta e o aperto no peito eram uma constante.
Chegados a Lisboa, seríamos entregues aos avós paternos dos quais nada recordava. Tinha convivido com eles em pequena e tinha-os visitado uma vez, quando viemos de graciosa, tinha eu quatro anos. Como percebem, as minhas lembranças eram nulas. O Luiz, o tal irmão com mais quatro anos, recordava-se deles. Tinha vivido com eles, quando fez cá a 1ª classe e consolava-me dizendo que não me preocupasse que ia correr tudo bem e que eles eram simpáticos e gostavam de nós.
Chegámos ao aeroporto de Lisboa e nem sinal dos avós. Primeiro grande baque, que medo! E se eles não viessem? E se se tivessem esquecido de nós? E se estivessem perdidos? Tantas perguntas afloraram a minha cabeça e medo, sempre presente o medo! Medo de estar sozinha. Medo de nunca mais ver os meus pais. Medo do desconhecido. Medo. É o sentimento de que tenho mais memória e aquele que melhor descreve o meu sentir nesse momento.
Esperámos, esperámos e esperámos um pouco mais. Esperámos aquilo que me pareceu uma eternidade mas que na verdade devem ter sido apenas uns quantos, poucos minutos. E vi o Luiz acenar e dizer - " Lá estão eles!". Olhei e vi dois estranhos. Um homem, velho. (aos nove anos todas as pessoas com mais de trinta anos são velhos), com sessenta e tal anos, pequeno, careca e gordito, com umas calças bejes, de cintura subida, cinto apertado em baixo do peito, camisa aos quadrados e  uma mulher, também ela velha, de saia e t-shirt, olharam para nós a sorrir e a acenar. Ía começar o segundo capítulo da minha vida e eu tinha apenas 9 anos.

21 de julho de 2014

Ouvir sem escutar


Em contexto de terapia, aparecem muitas vezes casais para aconselhamento matrimonial como último recurso para salvarem a relação. Depois de definir o problema, percebemos que o foco está muitas vezes numa deficiente comunicação.

Há pessoas que embora falando a mesma língua, não têm a mesma linguagem. Ás vezes, parece mais fácil a comunicação entre pessoas com línguas diferentes do que entre aquelas que têm uma língua comum. Quando estamos com alguém que não fala o mesmo idioma que nós, ouvimos e escutamos, damos atenção aos detalhes, à linguagem secundária, questionamos o nosso interlocutor, perguntamos o significado de determinada palavra ou expressão, procuramos perceber realmente o que o outro quer dizer e, dessa forma, estamos mais capazes de entender o que o outro está a querer realmente transmitir, muito além do que é dito verbalmente.
 
Pelo contrário, quando dialogamos com quem fala a nossa língua, temos tendência para deixar de escutar, ouvimos, interpretamos levianamente e depressa achamos que já percebemos tudo. Muitas vezes não procuramos realmente compreender o significado por detrás do que foi dito, não descodificamos a mensagem e isso é um grande obstáculo numa relação.

Quando o casal enfrenta dificuldades de comunicação deixam  de partilhar e é muitas vezes já em situação de pré rutura que procuram apoio psicológico. Aí, cabe ao profissional abrir vias de comunicação, descodificar conteúdos, restabelecer padrões quebrados ou estabelecer novos, traduzir a linguagem e verificar com cada um dos membros do casal separadamente ou com  ambos em simultâneo se aquela relação ainda pode ser restaurada e se vale ou não a pena lutar por ela.

18 de julho de 2014

Causas e sintomas de stress no trabalho



O trabalho pode ser fonte de rendimento, fonte de realização pessoal e pode, também, muitas vezes, ser factor de stress.
Estudos mostram que 75% da população activa mundial refere que hoje em dia há mais stress relacionado com o trabalho do que há gerações atrás e, mais grave ainda, 25% considera que o seu emprego é a primeira razão de stress nas suas vidas.

O aumento da competitividade entre colegas, a precaridade das condições de  trabalho e o risco permanente de desemprego são, só por si, potenciadores de stress mas entre as causas mais frequentes também encontramos:
- excesso de trabalho, com prazos difíceis de cumprir, em que a pessoa se sente exacerbada e não se consegue organizar
- falta de trabalho ou tarefas que ficam aquém das suas reais capacidades
- trabalho por turnos
- poucas expectativas de aumento de salário ou progressão de carreira
- falta de condições do local de trabalho com muita ou pouca luz, temperatura e ruído
- ausência de material adequado e equipamento pouco confortável ou em mau funcionamento
- pouca orientação por parte das chefias
- má relação com os superiores e/ou colegas que pode atingir mesmo perseguição e bullying
- falta de competências e preparação técnica para o desempenho da tarefa
- desequilíbrio entre a vida familiar e laboral

Quem sofre de stress apresenta um conjunto de sintomas reveladores:
- diminuição da atenção e concentração
- dores físicas diversas, enxaquecas, musculo esqueléticas, tonturas, cansaço, dores no peito e costas
- alterações das rotinas de sono
- alterações do comportamento alimentar com aumento ou diminuição de apetite e peso
- alterações do humor com aumento da irritabilidade e agressividade
- perda do sentido do humor
- alteração da qualidade do trabalho
- nervosismo, infelicidade, desmotivação
- aumento do consumo de álcool, tabaco e café
- baixas médicas

Este conjunto de sintomas podem facilmente evoluir para problemas físicos como a hipertensão, obesidade, acidentes vasculares e cardíacos e psicológicos como sejam a depressão, estados de ansiedade e adições.

Algumas estratégias:
- tire férias
- arranje um plano B para o caso de ficar desempregado ou se não gosta da carreira que escolheu
- aproveite os fins de semana para fazer programas que goste
- aproveite para conviver com a família e os amigos
- não leve trabalho para casa e evite discutir problemas laborais a toda a hora
- arranje um hobby que lhe dê prazer
- aprenda outras coisas de áreas diferentes da sua ou adquira novas competências
- aprenda a gerir conflitos

Stress no local de trabalho

Fala-se muito de produtividade e de rentabilidade e esquecemo-nos que esses rácios estão directamente relacionados com factores de stress no trabalho. É claro para qualquer pessoa, que um trabalhador com sintomas de stress laboral tenha uma produtividade diminuída em relação a outro sem sintomatologia, não só pelo número de dias que falta como pelo menor rendimento alcançado.
Segundo a OPP - Ordem dos Psicólogos Portugueses - o stress relacionado com o trabalho é na Europa o segundo problema de Saúde mais frequente, logo atrás das perturbações músculo-esqueléticas, e custa por ano em Portugal 300 milhões de euros.
Telmo Mourinho Baptista, bastonário da OPP, referiu que mais de metade dos trabalhadores europeus declaram que o stresse é “habitual no seu local de trabalho e aproximadamente quatro em cada dez trabalhadores consideram que o stresse não é gerido corretamente no seu local de trabalho”.

17 de julho de 2014

Que saudades do antigo Parque das Nações






Como moradora do Parque das Nações há uma década só posso manifestar a minha tristeza pelo estado desmazelado, pouco cuidado e abandonado a que o votaram.  Desde que foi constituída a nova freguesia do parque das nações e deixámos de estar sobre a gestão do Parque Expo, a degradação tem aumentado e chegámos a um extremo de desleixo total, parece que ninguém toma conta deste espaço e tudo que se degrada fica por arranjar, uma pena! O Publico hoje publica uma reportagem sobre este tema e é triste de ler o que nele se relata. Fica a sugestão.


16 de julho de 2014

Sabia que

 

50 milhões de pessoas usam benzodiazepinas diariamente?
As benzodiazepinas, usadas para tratamento das ansiedades, começaram a ser usadas na década de 70 e rapidamente ganharam adeptos por todo o mundo por serem mais seguros e menos tóxicos que os seus antecessores.

No entanto, o seu uso indiscriminado e abusivo levou a que seja hoje em dia um dos medicamentos psiquiátricos mais prescritos, inclusive por médicos de clinica geral e de família, com risco de dependência entre os seus utilizadores.

Pensa-se que as mulheres, com mais de 50 anos, são as maiores utilizadoras deste fármaco e que 1 em cada 10 adultos recebe pelo menos uma receita por ano. A mortalidade entre os dependentes de benzodiazepinas é 3 vezes superior do que no resto da população.

14 de julho de 2014

AHAHAHAHAH

Messi, o melhor jogador do mundial!
 É para rir, só pode!

2º lugar no torneio de futebol da McDonald

O Miguel e em grupo de amigos resolveram participar no Torneio da Mcdonalds, na categoria de sub10. O campeonato, uma mini copa do mundo, começou há 6 semana, com 16 equipas, distribuídas pelos diferentes grupos A,B,C,D, em que cada equipa representava uma das equipas participantes na copa. A equipa do Miguel defendia as cores da Alemanha e, contra todas as expectativas porque falamos de miúdos que não jogam futebol à séria, conseguiram apurar-se para a final, jogo que se realizou este sábado e em que infelizmente perderam por 2-1, conquistando assim um brilhante 2º lugar na prova, na sua categoria. Parabéns Alemanha, foram sensacionais!

Ficam umas imagens para mais tarde recordar.




10 de julho de 2014

Contratransferência e memórias



Ontem, em consulta, tive uma daquelas contratransferências. Para quem não sabe e tem curiosidade sobre estes temas, explico que a contratransferência é um conceito com origem na psicanálise e diz respeito aos sentimentos e emoções que o terapeuta experiencia em relação ao paciente, durante uma sessão de psicoterapia.

Como dizia, o relato do meu paciente fez-me reviver um dos momentos mais marcantes e sentir uma imensidão de coisas contraditórias que, como é óbvio, não vou expor aqui. Recordei tão intensamente a vinda para Portugal, retornada de Angola, com os meus 9 anos.

A última memória que tenho de Luanda é a de uma sessão fotográfica que a minha mãe fez questão de fazer para guardar. Era um tempo em que as fotos eram a preto e branco e o fotógrafo destacado para o serviço foi um tio, a quem sempre reconheceram jeito para a coisa. Eu e o meu irmão, vestidos a preceito, com uma mistura de riscas e quadrados que dá vontade de rir sempre que olhamos para as fotos, lá fomos para a ponta da ilha, empoleirados nas pedras, a contemplar o mar.

Se a memória não me atraiçoa gastámos um rolo inteiro entre os dois e devem ser as fotos mais bonitas que tenho desde sempre. Não me lembro se tive ou não consciência do que estava a fazer e do seu significado, sei apenas que quando olho para elas vejo mais do que as próprias imagens, vejo, sinto, cheiro, aquele mar e a saudade da terra é quase palpável. Sempre que olho para elas, agradeço à minha mãe essa ideia que, sendo tão simples, me permite ter sempre presente a minha terra e, hoje, agradeço também ao J. por me permitir reviver.

9 de julho de 2014

Fiquei assim

No momento em que a Mónica me disse que no próximo sábado vai fazer um salto de paraquedas. Medo!... Muito medo!

 

8 de julho de 2014

Correr Riscos

 

Quando temos de tomar uma decisão, uma de duas coisas acontecem: ou evitamos o problema ou o enfrentamos e lutamos.
 
Se evitamos, fingimos que ele não existe, adiamos a resolução, continuamos com as mesmas atitudes e padrões que tivemos até aí e, como é óbvio, tudo se mantém igual, nada muda e o problema lá está, ganhando cada vez maior dimensão e nós fazendo como a avestruz, de cabeça enfiada na areia. Este é o comportamento típico das pessoas com fraca auto estima, que se auto desvalorizam e que deixaram de acreditar em si, nas suas capacidades e potencialidades e é claro que arrastar os problemas só faz com que todo esse auto conceito negativo se vá confirmando uma e outra vez e aumentando a certeza que a pessoa tem de que não é capaz.

Por outro lado, quando enfrentamos o problema e o tentamos resolver, somos obrigados a analisá~lo, a reflectir sobre ele,  a decompo-lo nos seus mais variados factores e a agir. Temos de olhar para dentro de nós e perceber o que está mal, o que fizemos ou não para que a situação exista,   analisar as suas implicações, a descobrir em nós os recursos que temos de activar para a sua resolução e aí, sim, estamos mais perto da sua solução. 

Quando tomamos uma atitude, ainda que errada, estamos a desenvolver recursos, a explorar sentimentos, a crescer. Às vezes temos medo e esse medo é muitas vezes o motor que nos faz avançar em relação a uma solução e, mesmo que venhamos a constatar que a opção que tomámos não era a mais adequada, temos a obrigação perante nós mesmos, de tentar de novo, porque é correndo riscos que amadurecemos, é correndo riscos, que pomos à prova o que somos, é correndo riscos que vivemos.

Se conseguirmos esquecer os medos e agir e se então a isso juntarmos o que diz o nosso coração, estarmos mais próximos de ser felizes

Há um poema  do grande poeta E.E.Cummings, chamado "Dive for dreams" (Mergulhe em seus sonhos) que tem uma frase que gosto muito,

'Mergulhe em busca dos sonhos,confie em seu coração
se os mares explodirem em chamas
(e viva pelo amor mesmo que as estrelas se movam

para trás).


O poema é sobre  arriscar e confiar no nosso coração e é esse, sem dúvida, o caminho.

Este blogue surgiu porque há momentos em que nos questionamos por onde devemos ir, que caminho devemos tomar e este tipo de decisões nunca são fáceis de tomar. Se por um lado estamos numa situação que não nos completa, acomodados, mas sem rumo, por outro lado a mudança assusta demais porque o que temos, embora insuficiente, é o que conhecemos e ao que estamos habituados e com isso nós já vamos sabendo lidar mais ao menos. O resto, o desconhecido,  atemoriza-nos e, como todos sabemos, o medo muitas vezes paralisa e impede-nos de avançar.

Estou num desses momentos, de encruzilhada, e preciso perceber qual o rumo a tomar.Não quero com isto dizer que o caminho  a seguir tenha de ser necessariamente no sentido oposto ao que neste momento percorro, mas se esse não for o caso, a necessidade de reajuste é enorme. Preciso de ponderar com calma, medir os prós e os contras, analisar os mais diversos factores e, reflectir no que desejo de facto e, para mim, escrever ajuda-me sempre a ordenar ideias, olhar para dentro e  tomar decisões.

Assim, para além de um  escape, este espaço tem também como objectivo muito pessoal ajudar-me a encontrar o rumo certo.